sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Solidão - Iberê Camargo

Solidão, 1994. Óleo sobre Tela. Fundação Iberê Camargo.

Em Iberê a memória se torna a atualização do passado com seu conteúdo perceptivo de
aspectos afetivos ,sentimentais ou valorativos. O pintor é Ser temporal. Realiza sua percepção
num fluir contínuo onde o passado e o futuro se tornam distensões do presente.
 Iberê Camargo (1914-1994) já disse;" As figuras que povoam minhas telas envolvem-se na tristeza crepúsculos dos dias de minha infância, guri criado na solidão da campanha do Rio Grande do Sul.” É isso que se percebe nas obras de Iberê - artista e obra se confundem -  Ao longo de sua vida, Iberê Camargo produziu mais de sete mil obras, entre pinturas, desenhos, guaches e gravuras. Além de sua ampla produção artística, diversos documentos também foram conservados pelo artista e hoje pertencem ao acervo da Fundação Iberê Camargo.

Solidão foi o último quadro produzido pelo pintor Iberê Camargo. A obra condensa muitas das buscas poéticas e existenciais do artista. Para Maria Coussirat Camargo, sua esposa, a tela personifica a própria desolação humana,pois ele já se encontrava debilitado pela doença descoberta na década de 90 e, muitas vezes teve de ajudá-lo. O azul desmaterializa os corpos em "Solidão", iguala-os ao céu ao ar .A linha do horizonte desaparece não há mais tanta concretude.O fundo invade as figuras .Os corpos se assemelham a passagensde fantasmas .

"Solidão" juntamente com outras obras emblemáticas da trajetória final de Iberê traz uma melancolia marcada pela angústia ,a  tinta é mais diluída e as cores mudam: azul, cinza e violeta, tons mais escuros. As figuras humanas que habitam as telas parecem mais caricaturas. como as séries "Tudo te é fácil e inútil" e as "Idiotas" integram a exposição "Paisagens de Dentro: As Últimas Pinturas de Iberê Camargo" expostas em Porto Alegre.A critica de arte Icleia Cattani diz que "Nas telas de Iberê dos anos 90, as paisagens parecem ser geradas de dentro do próprio pintor, de dentro dos corpos humanos presentes nas telas, como se fossem criadas à sua medida. Essa característica é notável até sua última tela, Solidão", avalia a curadora. Realmente percebe-se na obra de Iberê traços sem definição e difusos no espaço marcados pela melancolia.Um pintor abstrato sem abrir mão da textura e do grafismo e moderno, mas rigoroso como os pintores clássicos.Uma coisa fica clara - a dramatização da experiência.


Jaguari-1941/40 x 30 cm
Óleo sobre tela












Sem título-1941
22 x 17,5 cm



As obras reproduzem algumas das principais características mantidas pelo artista para compor essas "paisagens", como os tons monocromáticos, e as figuras planas e desmaterializadas.









Auto-Retrato - 1984/óleo sobre madeira
 O artista realizou incontáveis auto-retratos(ao lado). Para ele, tratava-se de uma busca de auto-conhecimento e de questionamento interior : "Como modelo me transmuto em forma. Sou, então, pintura. Ao me retratar, gravo minha imagem no vão desejo de permanecer, de fugir ao tempo que apaga os rastros. O auto-retrato é uma introspecção, um olhar sobre si mesmo. É ainda interrogação, cuja resposta é também pergunta. Essa imagem que o pintor colhe na face do espelho, ou na superfície tranqüila da água, - penso no Narciso de Caravaggio – revela como ele se vê e como olha o mundo. (...) Não tenho presente quantos auto-retratos pintei. Se retratar-se revela narcisismo, todos pintores o são. Na sucessão de minha imagem no tempo, ela se deteriora como tudo que é vivo e flui. Muitas vezes, me interroguei diante do espelho. No passar do tempo, nos transformamos em caricaturas." (p.31-32, Lagnado) 



A Idiota - 1991- óelo sobre tela
“As Idiotas” -esperavam a vida passar. Sentados em bancos de praça,com rostos de bobos,irritantes e sem graça;olhares perdidos e feiúra dos corpos.
Em 1991, o artista começa a pintar As Idiotas - seres apáticos, incapazes de reagir à realidade circundante. Esses personagens apresentam-se envoltos na atmosfera ora sombria, ora crepuscular, que mescla o presente e o passado do artista.

A idiota, obra de 1991, é a primeira de uma série de idiotas que reaparecem em obras como As Idiotas, 1991, Crepúsculo da Boca do Monte, de 1991, ou na série Tudo te é Falso e Inútil, de 1992.


Iberê habita o mundo ,oferece à percepção uma função ontológica ,um vínculo singular com a produção e deflagração de sentido .Há um corpo e um tempo próprio do olhar de Iberê que se supera através de entrelaçamento entre visível invisível ,entre o acontecimento da verdade e seus desvelamentos . As coisas transpassam pelo corpo do pintor.É o corpo sensível que sente e se sente que sabe se sentir sentindo. Obra "A Idiota" , óleo s/ tela, 155 X 200 cm, 1991 “ É difícil revelar o significado das coisas. O Homem olha a sua face, interroga-se e não sabe quem é.”

A série  “As Idiotas”, uma das partes mais conhecidas da obra de Iberê, refletem sua visão sobre a natureza humana alienada e a tirania do tempo. “ A situação do homem no mundo foi sua preocupação constante e ficou manifestada por diversas vias nas suas pinturas, gravuras e desenhos”do início da década de 1990,e representam a fase final da obra de Iberê, que morreu de câncer aos 79 anos. “Iberê apresenta obras narrativas que descrevem uma ação ou situação envolvendo figuras tristes, com atitude de solidão e abandono, como se anunciassem o destino humano da morte” O próprio Iberê sintetizou: “O drama, trago-o na alma. A minha pintura, sombria, dramática, suja, corresponde à verdade mais profunda que habita no íntimo de uma burguesia que cobre a miséria do dia-a-dia com o colorido das orgias e da alienação do povo. Não faço mortalha colorida.”

Click e veja mais obras de Iberê:



Mais informações:
1990 - Fundação Iberê Camargo

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

O PORTO - Tarsila do Amaral


O Porto - Tarsila do Amaral
Tarsila do Amaral,como em outras obras já comentadas neste blog,traz obras nitidamente cubistas, mas impregnadas de uma brasilidade que se manifesta sobretudo nas cores, que Carlos Drummond tão bem definiu: “O amarelo vivo, o rosa violáceo, o azul pureza, o verde cantante”. 
"O Porto" de 1953 após ter passado pela fase do Pau-Brasil,Antropofágico e Social;Tarsila retoma os anos 50 e  volta ao tema “pau brasil”. Participa em 1951 da I Bienal de São Paulo. Em 1963 tem sala especial na VII Bienal de São Paulo e no ano seguinte participação especial na XXXII Bienal de Veneza. Faleceu em São Paulo no dia 17 de janeiro de 1973.  "O PORTO" é um bom exemplo da retomada do Cubismo, pois entre as caracteríticas principais de Tarsila está o uso  de cores vivas, a influência do cubismo (uso de formas geométricas) e a abordagem de temas sociais, cotidianos e paisagens do Brasil.

Nesta  tela, de composição geometrizada ao máximo mas sem detrimento das figuras, com planos bem definidos e linhas simplificadas; a artista põe a mostra o que aprendera em seu 'serviço militar do cubismo' nos ateliês de Lhote, Gleizes e Léger, artistas que haviam se afastado do austero e cerebral cubismo de Picasso e Braque. 
Traço constante de sua obra, a presença da busca de uma cor verdadeiramente brasileira ou caipira : rosa e azul claros, ou o verde e amarelo do nosso colorido tropical, a cor é um dos elementos mais valorizados em sua composição.